sexta-feira, 19 de agosto de 2022

O Ninho e a Casa dos Sonhos

 Eu e minha esposa, em nossas andanças pelo quintal, certo dia fizemos uma grande descoberta: em um pé de azaléas, que não era muito alto, havia um lindo ninho de Coleirinhas, confeccionado com raízes nobres... E foi fácil dimensionar o capricho, o carinho com que aquele casal havia construído seu ninho. Imagino também o diálogo do casal emplumado, com o ninho quase pronto: “Experimenta, querida!” dizia o marido à sua esposa... Ela, então entrava no ninho, dava uma reboladinha e dizia: “Ui! Tem uma pontinha cutucando aqui nesse canto!” E a raiz era logo substituída, por outra mais confortável...

Finalmente pronto, foram colocados dois ovinhos, que minha esposa chamava de “pedrinhas”, para que eles não gorassem.

Víamos sempre o casal indo e vindo e a fêmea chocando, sendo carinhosamente alimentada pelo seu esposo. Como a primavera é sempre chuvosa, colocamos um guarda-sol e abrigamos o ninho das intempéries, e eles agradeciam, cantando.

Era costume nos ausentarmos de casa, por motivos de pequenas viagens e quando retornamos de uma dessas viagens, umas das primeiras coisas que fizemos foi examinar o ninho.

Mas, da varanda da casa pudemos contemplar o casal desolado, olhando tristemente para o lugar onde deveria estar o ninho. Chegamos então à conclusão de que alguém havia levado mexido no ninho, levado o ninho, e ficamos muito tristes!

Como ninguém entrava na casa, suspeitamos que nossa auxiliar de serviços domésticos havia levado alguém para ajudá-la e possivelmente esse alguém tivesse roubado o ninho. O casal de coleirinhas perdera a sua casa, construída com muito sacrifício, além de não sabermos do paradeiro dos ovinhos...

 Como é triste a história daquele que perdeu seu lar... Agora, permita-me compartilhar com você outra história nossa...

Nossas duas filhas foram estudar no colégio adventista em Hortolândia, perto de Campinas (SP). A primeira vez que fui com minha esposa pagar a mensalidade, fiquei encantado com a beleza do bairro, cortado por ruas asfaltadas e iluminadas, em cujas calçadas existiam árvores frutíferas de flores lindas, como a "Pata de Vaca” de várias cores, brancas, azuis, roxas, que exalavam um perfume delicioso. Era sexta-feira e ao pôr do sol, fomos brindados com o som divinal de pianos e órgãos entoando hinos que nos davam a sensação que anjos estavam presentes no local.

Falei à minha esposa: “Vou comprar um terreno nesse lugar e quando eu me aposentar, vamos construir uma casa e viremos morar aqui.

Passamos quatro dias na casa de um casal amigo e depois de muito procurar conseguimos encontrar o terreno para construirmos o nosso lar. A proprietária (ou os proprietários) queriam pelo lote CR$ 1.350.000,00 (um milhão e trezentos e cinquenta mil cruzeiros) e eu só tinha CR$ 750.000,00 (setecentos e cinquenta mil cruzeiros) ... Fiz a eles, então, uma proposta: “Dou CR$ 2.000.000,00 (dois milhões)!”, (sob o olhar atônito de minha esposa, que me perguntou inclusive se eu estava bem) e completei a proposta: “CR$ 2.000.000,00 (dois milhões de cruzeiros) da seguinte forma: CR$ 700.000,00 (setecentos mil cruzeiros) agora e mais 13 parcelas mensais de CR$ 100.000,00 (cem mil cruzeiros).” Detalhes acertados, fomos ao cartório, ao banco, e assim concluímos o negócio mais bem sucedido da minha vida.

Não atrasei uma parcela sequer! Passou o tempo e com a aposentadoria se aproximando, começamos a cuidar da construção do nosso lar: contratamos com um pedreiro que fez o desenho da construção; o chefe do Departamento de Obras de Sumaré (que era Candidato a Prefeito) assinou a planta; fui à Mogi Mirim na fábrica de azulejos e levei minha esposa que escolheu os que eram do seu gosto; também fomos ao depósito Santa Isabel, o maior da região, e compramos todo o material para levantar a nossa tão sonhada casa - portas e janelas da marca Sasazaki, batentes de madeira, pedra de pia, torneiras, louças sanitárias (lavatório, vaso, assento, tudo azul!)

Pagamos impostos e taxas que estavam atrasados, cumprimos todas as exigências públicas. Compramos o poste e a caixa de luz, além da caixa correio. Para iniciar, pedimos ao pedreiro que construísse uma edícula para guardarmos todo o material que não era pouco e se encontrava na garagem da antiga proprietária, nossa vizinha.

Nessa época, morávamos em Santos e acabamos ficando alguns meses sem ir à Hortolândia, não acompanhando assim a construção. E, em uma ida da minha esposa ao colégio, ela notou que o pedreiro havia utilizado na edícula, diversas peças que se destinavam à casa. O pedreiro então, ao ser chamado à atenção, demostrando alto índice de profissionalismo, pediu demissão.

Com a contratação de outros pedreiros conseguimos concluir a construção da edícula e foi quando o país passou por mais uma crise. Foi muito difícil... Fomos forçados a entregarmos o apartamento que morávamos a 16 anos, por não poder pagar o aluguel. Eu estava aposentado, vivendo sozinho com minha esposa, não havia mais nenhum filho morando conosco... A saudade do mar, da cidade, dos amigos me corroía por dentro. A cidade recém-emancipada de Hortolândia, não oferecia recursos. Por diversas vezes aluguei apartamentos em Santos, tentado voltar a cidade que tanto amo, mas não tive sucesso. Até que em minhas andanças e consultas pelas imobiliárias, encontrei um anúncio que dizia: “Vendo chácara, alto padrão, toda murada, em Pedro de Toledo, pelo valor de R$ 43.000,00 (quarenta e três mil reais).

Tínhamos um filho, o Layry, morando na cidade e por diversas vezes tínhamos ido visitá-lo utilizando como meio de transporte o trem, que na verdade era muito romântico! Então, fomos ver a propriedade!

Chegando ao local, pudemos contatar quer a realidade era outra, muito diferente do anúncio: era apenas uma casa com quintal, nem mesmo murada a propriedade era, mas sim cercada com telão de arame!

Minha esposa havia ido comigo, e eu tentei mostrar a ela que não era aquilo que havíamos idealizado. À época, estávamos bem de saúde e caminhamos então pelas ruas esburacadas até a pista (que também era uma porcaria), para conhecer a região. Eu bem que tentei dissuadi-la da ideia de trocar a nossa edícula por aquela casa. Mas ela estava  encantada pela tal casa, pois no entender dela era a tal casa era grande, alta e mais outras qualidades que eu não conseguia ver...

Ela se esqueceu de todo empenho e sacrifício que tivemos para levantar aquela edícula. Antes de ir para Pedro de Toledo havia conversado com o “cidadão, proprietário da chácara" que no caso do negócio efetivado ele levaria sua mudança e traria a minha no mesmo caminhão...

Daí, informei o cidadão que não haveria negócio porque não era aquilo que estava no anúncio. Argumentei isso, pois pensava que minha esposa estava concordando comigo. Era um domingo... Segunda-feira, nos sentamos no murinho e olhávamos o quintal: mangueiras, abacateiros, maracujás, pés de mexerica, goiabeiras, limoeiros, laranjeiras, esse era o nosso pomar! Comentei com minha esposa o negócio que não fizemos e eu não sabia os pensamentos dela... Fiquei surpreso com o seu argumento: "É... vou ter que ficar morando neste lugar que nem camada de ozônio tem? Olha minha pele manchada, estou ficando com câncer de pele!"

Então tentei argumentar: "Mas querida, aqui em Hortolândia, não vamos precisar fazer mais nada... Agora é só correr para o abraço!!

E não adiantou nada discutirmos. Entendi que se ficasse morando em Hortolândia, ela transformaria minha vida em um inferno!

Então, fiz o pior negócio da minha vida e a 16 anos moro do outro lado do paraíso... Pelo menos, aprendi uma coisa: quando não se busca a  orientação divina, vem a frustração, a depressão, a saudades e o arrependimento!

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